Para começar cabe fazer a seguinte pergunta: Qual o papel de um centro de educação infantil com relação a qualidade da alimentação de uma criança? Quais os limites de interferência de uma creche durante esse processo?
Essas são questões primordiais que se consolidam em muitas dúvidas durante o processo de construção de hábitos alimentares na infância.
O Referencial Nacional Curricular para a Educação Infantil destaca entre outros assuntos o cuidar e o educar como ações indissociáveis, e as atitudes que correspondem a esses aspectos não devem ser pensadas separadamente, ou seja, “contemplar o cuidado na esfera da instituição da educação infantil significa compreendê-lo como parte integrante da educação”. p.24 (Ministério da Educação e do Desporto, Secretaria de educação Fundamental, 1998).
Focando especificamente para o nosso tema devemos lembrar que ao oferecermos alimentos a uma criança, estamos oferecendo conjuntamente, valores, hábitos, crenças e tradições que falam de nós mesmos e de nossas formas de se alimentar.
O homem, ao contrário dos outros animais, não come somente para matar a fome. Come para estar com amigos. Para festejar, fechar negócios, despedir-se. O homem come para cultuar. A comida tem um significado social. (PIOTTO, FERREIRA, PANTONI, 2002, P.126)
Portanto, alimentar envolve tradições como: por a mesa, compartilhar, degustar, trocar ideias e admirar a qualidade dos alimentos que ali estão. Isso envolve tempo e disponibilidade para compartilhar esses momentos na companhia das crianças. Em uma relação de igualdade onde os alimentos sejam para todos, sem distinção de adultos e crianças.
A criança precisa sentir-se dentro de um contexto alimentar onde ela não precisa ser a atenção principal, mas uma companhia adequada para estar com os pais vivendo um momento agradável. Porém, novamente como destacado por PIOTTO, FERREIRA, PANTONI ( 2002) “Logo a criança descobre que comer é uma maneira de se relacionar com os outros. E não comer faz parte disso.” p.126
Além desse aspecto para complicar mais as coisas todos sabemos a corrida diária que enfrentamos na luta pela sobrevivência, e que na maioria das famílias é impossível manter esse modelo ideal de rotina alimentar com as crianças, apesar de sabermos que sempre que possível é importante valorizar esses rituais.
O trabalho da creche entra nesse momento representando um contexto social mais amplo, onde a criança poderá ter acesso a diversos alimentos com formas, sabores, texturas e cores, elaborados por uma equipe multidisciplinar composta de nutricionista e educadora.
Nesse ambiente a criança poderá cheirar, pegar, sentir a comida, com uma certa liberdade que em sua residência fica mais difícil; além de estar exposta ao aprendizado coletivo, pois na companhia de outras crianças poderão, muitas vezes comer mais do que se alimentam normalmente sozinhos e na companhia apenas de adultos.
Contudo, para que essa troca seja saudável é necessária a ajuda de todos os envolvidos. A creche participa com as orientações que possam se adequar a maioria. E as famílias das crianças com o respeito aos acordos alimentares estabelecidos pela instituição.
É difícil conciliar os horários restritos, a busca de alimentos saudáveis e de qualidade que estejam de acordo com os nossos hábitos alimentares, porém, é inaceitável não olhar para este assunto com atenção e comprometimento, pois em um espaço coletivo nossas atitudes influenciam não só na vida de nossos próprios filhos, mas influenciam na vida de muitas crianças que compartilham o mesmo espaço de convivência.
Portanto, um centro de educação infantil de qualidade tem a obrigação de zelar pelo bem de todos e orientar além de estratégias para garantir uma boa alimentação, oferecer dicas de quais alimentos são mais indicados, preservando assim, a saúde das crianças que estão sendo cuidadas e educadas coletivamente.
Termino por aqui lembrando que educar é um processo constante e continuo que envolve afeto e atenção e acima de tudo “o desejo de estar nesse lugar!”
Adelaide Rezende de Souza, Psicóloga na creche-escola Ladybug
Professora da Universidade Estácio de Sá, psicóloga (pela UFPA), especializada em saúde mental e desenvolvimento infantil e do adolescente (SCMRJ), com mestrado em psicologia e teoria do comportamento (UFPA) sua dissertação teve como título: “Resoluções de conflitos entre crianças através de brincadeiras de rua”. Ministra cursos sobre jogos e brinquedotecas. Consultora de instituições de educação infantil.
Referências Bibliográficas
BORBA, A. M. O brincar como um modo de ser e estar no mundo. Texto publicado no documento da secretaria de educação do município do Rio de Janeiro, Ensino Fundamental de nove anos. Orientações para a inclusão da criança de seis anos de idade, 2006.
SOARES, M. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 1998.
MELLO, S. A. O processo de aquisição da escrita na educação infantil – contribuições de Vygotsky . In GOULART, A. L., de F. e MELLO, S. A. Linguagens Infantis outras formas de leitura. Campinas, SP: Autores Associados, 2005.
PIOTTO, D., C., FERREIRA, M., V., e PANTONI R. V. Comer, comer... comer, comer... é o melhor para poder crescer... In ROSSETI - FERREIRA, M. C. (orgs) Os fazeres da educação infantil. SP: Cortez, 2002,
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto, Secretaria de educação Fundamental. Referencial Nacional Curricular para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998
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